Quem controla os controladores: contra eles não há a quem recorrer
De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto. Essa foi a obra da República nos últimos anos.
Assim começa a constatação de Rui Barbosa (1849-1924), ao expressar sua frustação com o novo regime de governo, em seguida à deposição do imperador Dom Pedro II. Talvez você não se recorde, mas este colunista iniciou seus escritos neste espaço com uma reflexão em alusão ao Golpe Republicano de 1889.
Hoje, caro(a) leitor(a) iremos fazer um pequeno tour por uma das instituições que recebemos como herança da chamada – tripartição dos poderes, proposta pelo iluminista Charles-Louis de Secondat, o Barão de Montesquieu (1689-1755). É conhecido pela sua teoria da separação dos poderes, atualmente consagrada em muitas das modernas constituições internacionais, inclusive a Constituição Brasileira.
Neste sentido, o professor Joseval Santana destaca que, “a célebre doutrina da “separação dos poderes” de Montesquieu, baseada na constituição “mista” discutida por Platão, Aristóteles e Políbio, visou moderar o poder do
Estado mediante a divisão de competências entre os órgãos: executivo, legislativo e judiciário. A vigilância da harmonia desses três poderes no Brasil começou a surgir no período republicano e se consolidou na carta magna de 1988, com a ampliação do papel do Ministério Público (MP) ”.
É no âmbito da literatura, para nossa reflexão, sobretudo do ordenamento jurídico moderno que iremos caminhar, nos apontamentos sobre certos equívocos, excessos e abusos, cometidos no presente por este poder e seu correspondente institucional. Digo isso, porque é na letra da lei que tudo, ao menos na modernidade, vai sendo produzido, se expandindo e controlando, ao ponto de, salve suas particularidades, subtraindo a autonomia dos indivíduos, nos colocando num pacote de coletivização (e este, diga-se de passagem, nos fazendo por sua vez, rivalizar).
Sem sombra de dúvida, controle, com certas medidas, são necessários, mas o que está em jogo aqui, é a objetividade da moral, o papel da vontade e da razão, ou melhor, onde fica a razão em detrimento da vontade, ou ainda, a falta de responsabilização de pessoas que se utilizam de um lugar, para desmandar e reordenar na máxima: faça-se conforme o meu agrado.
Em linhas gerais o que se pode apreender diante do que temos presenciado e visto se resume, ao que pese, podemos resumir, numa fala recente do atual Ministro da Justiça, em relação as Big Techs. Durante uma reunião em 10 de abril, o ministro ameaçou representantes de Twitter, Meta, TikTok, Kwai, WhatsApp, Google e YouTube. O objetivo do encontro era esclarecer as políticas de uso das plataformas sociais.
Nas palavras do ministro: “Esse tempo da liberdade de expressão como um valor absoluto, que é uma falcatrua, acabou no Brasil. Foi sepultado. Se os senhores não derem respostas que consideramos compatíveis e ajustadas, tomaremos providências que a lei determina. Vocês viveram o processo eleitoral de 2022, no Brasil. Adotem isso como referência.
É como nós faremos com os senhores. Tenham clareza disso. Vamos fazer todos os dias, até que vocês se adequem a uma premência”.
Um reflexo, por assim dizer, de como andam de mãos dadas certas arbitrariedades. Ora, se é de “pequeno que se torne o pepino”, para o bem ou para o mal, de pequenos atos, se agigantam grandes impactos. Afinal, onde chegaremos, se tudo ser tingido ao movimento das ‘canetadas’?
Assim, violar o princípio da harmonia entre os poderes dilui o manto da democracia e produz o manto vil do poder – a ditadura. Neste regime, o mal é singular, se sobressaindo, de modo a instituir o “novo normal”, e sem que as pessoas percebam (na sua fase germinal), se estabelecem e tomam conta de nossas vidas.
Contudo, nos fica uma questão expressa na sentença de Shakespeare:“Num país onde os juízes roubam, os ladrões têm perfeitamente o direito de roubar”.